terça-feira, 26 de novembro de 2013

Este filme é uma das coisas mais linda que já vi.

http://www.youtube.com/watch?v=Klx8UBMRrMA&hd=1

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Dificuldades com críticas

Acho que tenho dificuldades com críticas, não aquelas educadas, que tendem a me marcar pela lógica e pelo conhecimento melhor do que o meu. Agora, críticas grosseiras, desrespeitosas e cruéis, essas são pra matar. 
Vejo nitidamente quando alguém está sendo tomado pela soberba, juro! Depois da soberba vem a megalomania e aí está tudo perdido. Essa pessoa incomoda, fala mal dos outros, enumera suas qualidades, conta com números suas vitórias, mesmo que sejam imaginárias. Geralmente o megalomaníaco não se importa com a opinião dos outros e nem pensa em poupar ninguém das suas críticas, isso quando ainda vê os outros. 
Tenho horror aos toscos, aos mal educados, aos grosseiros, aos sabe-tudo. Abomino quem não tem delicadeza no trato com as pessoas. Detesto quem denigre e desprestigia o trabalho dos outros. Não suporto quem não escuta por já saber melhor o que o outro está contando. 
Hoje estou num mau dia, por que tive uma má noite. 
Estou tentando lembrar só dos que me animam e respeitam. Que coisa! Dizem que quem faz os outros sofrer, sofre muito e o que ele faz é o que está transbordando de si.  

Um encontro e tanto!
                Encarregaram-me de organizar o encontro da Turma de Formandos do Instituto Educacional de 1968. Era a minha turma formada por trinta e oito pessoas. Compareceram ao encontro quinze deles, só!
                Começamos a façanha por uma conversa entre o Zilmar Gabriel e eu, falando da saudade que sentíamos. Daí a organizar tudo foi um passo! A dificuldade foi lidar com a resistência dos sessentões em aderir à internet. Primeiro procuramos pelos nomes nas redes sociais, onde encontramos principalmente as meninas e alguns meninos. Trocamos fotos de uma forma impensada há alguns anos, em uma velocidade incrível. Alguns custaram a acreditar.
                O desejo de realizar o encontro estava instalado. Passamos a procurar os que não constavam das redes sociais e, aos poucos, as pessoas foram aparecendo. De muitos lugares do Brasil. Encontramos colegas doentes, outros soubemos mortos, outros não se interessaram, mas os que alcançamos, esses sim, aceitaram com entusiasmo. Criamos uma página secreta no facebook, só para a turma, onde combinamos tudo, tudo.
                Encontrar locais para conversarmos foi coisa rápida também. Encontramo-nos em um bar à noite e em um sítio no outro dia.
                Fomos o Domingos e eu bem mais cedo ao bar e, confesso, eu temia não reconhecer os colegas que não via há 45 anos. Aí concluímos que a gente procuraria por cabelos brancos, bengalas e afins. Eis que começaram a surgir os sexagenários e alguns septuagenários. As meninas todas lindas, lépidas, sorrindo e mostrando uma jovialidade maravilhosa. Os meninos todos senhores fortes, saudáveis, alguns meio barrigudos, mas todos muito bem postos. Não lembro de ver alguém dizer que não podia comer e beber isso ou aquilo. Todos perfeitamente bem. 
                Logo a algazarra estava formada. Os garçons olhavam para mim em desespero, por que os meus amigos não saíam do corredor e as amigas não falavam baixo de jeito nenhum. Aos poucos fomos nos acalmando e pude olhar por cima da mesa e reconhecer uma por uma daquelas fisionomias. Trocamos fotos, flâmulas, bíblias autografadas pelo professor Otto Gustavo Otto, convites originais de formatura.
                O que me emocionou foi constatar que fomos uma juventude que amadureceu muito cedo, que trabalhou muito, conquistou tudo com dificuldade, conseguiu filhos e filhas muito bem sucedidos e está envelhecendo com qualidade graças à tecnologia, que conserta algumas coisinhas  que o tempo teima em estragar em nós.

                A despedida foi feita de promessas de um novo dia como aquele, dessa vez mais pretencioso. Escolhemos uma praia e já estamos providenciando as sungas e biquínis. Trocamos algumas dicas de emagrecimento rápido também. Mas vamos perguntar ao geriatra se pode. 

sábado, 2 de novembro de 2013

Texto publicado hoje em O Nacional

O pai está ocupando a sala da frente, até que enfim!

                No quesito criar filhos, a mãe era naturalmente a protagonista. O pai, provedor, ocupava uma posição secundária, já que homem não amamenta, não tem jeito para segurar alguém tão frágil, precisa descansar, é quem traz comida pra casa. O enredo descrito não está muito, muito lá no passado. Os mais velhos lembram bem de como era necessário cuidar do pai, temer o pai, deixá-lo quieto lá no lugar mais sossegado da casa. Comia-se quando o pai chegava, nem antes, nem depois.
                Estamos assistindo ao nascimento da ternura no coração dos pais daqueles tempos pra cá. Ou será que não é o nascimento, mas está-se dando luzes à ternura no coração deles? Ou as mães estão permitindo o escancaramento da ternura dos pais? Ou os pais estão deixando de lado a vergonha de parecerem piegas, e querem assumir-se como também amorosos?
                O certo é que vivemos uma nova ordem, bem mais bonita. Na edição de 26/10 de ZH, Ticiano Osório conta a trajetória da sua família nos cinquenta e um dias de internação da filha prematura, Aurora. Ele participou ativamente do processo de sucessivos ganhos de peso, de evolução evidente de um quadro perigoso para a normalidade e do susto em levá-la finalmente para casa, com tudo o que isso traz de alegrias e responsabilidades. Piangers, que tem orgulho de ser paizão, escreve em sua coluna sobre o que ele faz no afã de fazer a filha Aurora (outra Aurora) dar gargalhadas, já que ele não entende a vida sem elas. Seu relato da correria dos dois pela casa, Aurora sem fraldas, do xixi no meio da sala, das gargalhadas que isso provoca, deixa qualquer um comovido.
                Pois bem, o fato é que o pai foi alçado a protagonista ou ele alçou-se a esse novo patamar. Ele não é absolutamente um coadjuvante, não mais! Ele cria junto com a mãe e é feliz como ela sempre foi, por que finalmente faz tudo aquilo de apaixonante reservado às mães, que mordem, beijam, apertam, acariciam, cheiram, amam desmedidamente. As mães têm agora um competidor à altura pelos barulhinhos, risadinhas, colos e sonecas a dois, que elas estão encantadas e precisadas de compartilhar.

                Frequentem então a sala da frente da vida, pais, por que este é o lugar que sempre lhes foi reservado, mas agora vocês resolveram ocupar maciçamente. Parabéns aos filhos, por que a chance de serem felizes aumentou. 

sábado, 26 de outubro de 2013

Liberdade para Ana Paula.

                A família de Ana Paula, a ativista porto-alegrense do Greeenpeace presa na Rússia, causa-me um grande mal estar. Posso imaginar a situação da mãe da moça, tão longe da filha, temendo o que poderá acontecer com ela.
                As mães são feitas do mesmo estofo, mas as reações aos passos autônomos dos filhos e filhas são diferentes de uma para a outra. Há quem sinta orgulho, quando seus rebentos manifestam-se em favor de uma causa, principalmente se for uma boa causa. Há as que procuram conter o ímpeto juvenil, por medo de que a ousadia deles seja castigada de alguma forma.
                A cada passo mais ousado, o temor pelo desconhecido é muito mais forte por parte dos pais, do que por parte da juventude aventureira. Há um momento em que o espírito de aventura dá lugar a algo mais consistente e percebemos nosso filho ser tomado por um sentimento bem peculiar à juventude, assim como já foi para nós, os mais velhos. A utopia é a mola propulsora de quem é acometido pela compaixão.
                Preocupa-me a ânsia dos pais em dar limites aos filhos, quando o papel deles deveria ser o de empurrá-los para que ousem, para que se arrisquem. O limite deve restringir-se à consciência de que há o outro, que isso sim é importante. O respeito ao outro é algo que se aprende pelo exemplo, por que, ninguém pega um livro em dado momento da vida e dá para os filhos para que aprendam a respeitar e a ter um comportamento ético. Não há livro, nem palestra, nem diálogo que dê conta de um sentimento tão delicado, que é o do respeito aos semelhantes.
                Ana Paula está presa no outro lado do mundo e quando liga, mãe dela ouve que a saudade está sendo absurdamente maior do que o normal. Posso tentar imaginar o desespero dessa mulher por querer atravessar o mundo e pegar a filha no colo, dizer-lhe que fique tranquila, que tudo vai se resolver. É isso que nós, as mães, sabemos fazer muito bem. Mas Ana Paula não tem isso, nem a mãe tem a chance de exercer um ato tão natural.
                A manifestação que a mãe de Ana Paula está preparando para que as autoridades brasileiras encontrem um jeito de trazer a filha de volta, talvez seja a única coisa que pode ser feita. Nós as mães estamos solidárias, mas cientes de que mais dia menos dia a nossa criança poderá estar em maus lençóis, por engajar-se no que acredita seja o melhor para o mundo.



Publicado em O Nacional de hoje

                

sábado, 19 de outubro de 2013

O Nacional de 19 de outubro de 2013 - Coluna da nova fase após Diário de Uma Ex-Fumante.

Sobre envelhecimento, infância e cuidado.

                Fabrício Carpinejar deixou-me profundamente comovida com sua crônica de domingo em ZH. Revivi os anos de convivência íntima com meus pais, pelo fato de terem morado conosco até a morte. O assunto que ele levanta é das coisas mais delicadas que conheço.
                Estamos em vésperas do Dia da Criança e isso comove também. Somos pessoas que cuidam das duas pontas vulneráveis da trajetória humana: os velhos e as crianças. Não imagino algo mais importante de se fazer.
                Fizemos isso ao mesmo tempo lá em casa. Nossas crianças conviveram estreitamente com os avós, viram-nos participar da nossa grande mesa, viram o processo de envelhecimento acontecer devagar, mas de forma inexorável. Já nossos velhos alegraram-se com os nascimentos, os choros, as traquinagens, os progressos e, garanto, tudo aconteceu como devia, exceto o sofrimento que acompanhou minha mãe durante anos.
                É preciso coragem para viver de verdade, por que viver de verdade traz um monte de responsabilidades. Esta contingência não aceita desculpas e não perdoa omissões. A vida cobra cedo ou tarde e devolve tudo com generosidade. É difícil conseguir ser feliz sem cumprir o que nos cabe.
                Para que consigamos dar conta de tanta coisa, contamos com a tecnologia, que fornece fraldas maravilhosas, escolas bem equipadas e dentro delas as cuidadoras e professoras fazem tudo para o conforto e o desenvolvimento das nossas crianças. Contamos também com fraldas geriátricas e instituições modelo e dentro delas, cuidadores especializados em proporcionar bem estar aos idosos. As fraldas são itens importantes, no começo e no fim, no geral.
                Levar nossas crianças a frequentar escolinhas é um imperativo hoje em dia, dado a ausência dos pais o dia inteiro. Levar nossos velhos a morar em lares para idosos pode parecer crueldade, mas não é. Crueldade é não dar as condições necessárias para o cuidado adequado.
                As escolas não são depósitos de crianças, nem as casas para idosos são depósitos de velhos. Necessitar de socorro não pressupõe abandono nem desinteresse. Abandono é pensar que estranhos podem tomar nosso lugar.
                Nós somos insubstituíveis, por que carregamos conosco todo o potencial de cuidado amoroso de que os nossos pais e filhos necessitam. Precisar de ajuda não é falta de amor. E falar sobre isso é necessário.

                

sábado, 28 de setembro de 2013

DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE

                Estou começando a sentir-me a vontade na nossa casa nova. Sinto de novo a alegria de arrumar tudo, de olhar atentamente para descobrir o que está faltando naquele cantinho ali. Olho para as minhas coisas velhas, aquelas que não são grandes demais e que pude trazer pra cá, aí lembro de tanta coisa.
                Já consigo voltar à casa velha e deitar os olhos sobre o que abrigou tantos anos de felicidade, de tanto trabalho, de tantas mesas cheias. Nossa enorme mesa não era só cheia de comida, mas cheia de gente. Era lá que combinávamos tudo. A gente tinha que ver como pagava as contas, quem pegava as crianças na escola quando havia um bebê novo, quando daria pra operar amigdalas e adenoides crescidas da criança da vez, sempre aos quatro anos.
                As marcas da nossa família ficam impregnadas nas paredes, na atmosfera de uma casa. Essa atmosfera tem um tempo de vida, acho. Senti isso muito forte nos dois primeiros meses, mas agora já está sendo algo agradável visitar onde moramos por tanto tempo. Já acho muito bom voltar para a casa nova, que já sinto nossa. Abro a porta e sinto o cheiro, a atmosfera que já é perceptível e que me agrada.
                O que estou estranhando é a vontade de fumar que está voltando com mais frequência. Acho difícil ver uma mulher fumando, fazendo pose, repetindo o gesto que fazia parte de mim. Fico confusa às vezes sem saber o que me incomoda, quando me surpreendo com a naturalidade com que eu acenderia um cigarro de forma automática, sem pensar. Descubro que não o faço, por que não tem cigarro disponível, aí reajo, faço alguma coisa, tomo água gelada.

                Esta coluna serve para me compromissar com você e comigo. Vou aproveitar essa tranquilidade de haver me acostumado a uma nova vida e encontrar coisas a fazer suficientes, para que as fissuras passem ao largo, sem prejudicar o que foi tão difícil conquistar. Torçam por mim, por favor! 
DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE

                Há assuntos que vêm à baila e que mexem conosco. Hoje no Fantástico trouxeram o projeto de lei que ainda dorme em algum lugar do senado e que se chama Lei da Palmada. Já discuti este projeto em várias instâncias e sei que nem de longe é unanimidade.
                Ao ouvir o povo a respeito da palmada lembrei de que há alguns anos era comum fumar em qualquer ambiente. Tínhamos professores fumantes, colegas  fumantes e, apesar de desagradável, não era estranho o fato de fumarem em aula. Lembro que nunca fui proibida de fumar em qualquer emprego que tive.  Foi necessário que se fizessem leis para que acabasse  a farra do cigarro em lugares fechados.
                A proibição ao cigarro foi contestada, argumentou-se que a lei feria a liberdade individual, o direito de exercer uma atividade que não causa alucinação, nem diminuição de capacidades físicas. Pensou-se na época que a lei não “pegaria”. Ela foi taxada de desnecessária e autoritária.
                Há vinte anos, em todos os lugares havia avisos de Proibido Fumar. Hoje podemos até nem ver aviso algum, mas incorporamos à nossa vida o que a lei trouxe para mudar nossos hábitos e nossos conceitos sobre o assunto e vivemos agora com muito mais limpeza, pelo menos no ar, por que o chão em alguns lugares é um horror.
                Com a lei da palmada, penso, acontecerá a mesma coisa. A punição física é perniciosa, ela fere o que uma pessoa tem de mais caro que é sua integridade física e moral, costuma descambar para a pancadaria e não faz bem nem para quem bate, nem para quem apanha.
                Espero que daqui a alguns anos a gente possa contar às pessoas que lá por dois mil e treze as pessoas ainda batiam em crianças e, pior, com o intuito de educa-las. Espero que as pessoas sabedoras desse fato fiquem muito horrorizadas e não haja mais necessidade de que conselhos tutelares interferiram no direito que cada família tem à privacidade.

                Sei que é polêmico o que estou trazendo, mas acredito que há leis civilizatórias e necessárias quando não conseguimos evoluir sem um empurrãozinho.





sábado, 14 de setembro de 2013

DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE - Textos publicados no Caderno de Saúde do Jornal O Nacional todos os sábados.

PAREI DE FUMAR
Esta é a terceira vez que paro de fumar. Das outras duas tive êxito, juro! Fiquei um ano e três meses livre e saudável.
O que me fez perder a batalha, nas duas vezes, foi a valentia e a saudade. Valentia por me sentir totalmente fora do vício e saudade da companhia, do ritual de pegar aquele objeto tão próximo, por tanto tempo, e fumar.  De valente e saudosa a fumante foi um passo.
 Um cigarro e a intenção de não repetir, a outro cigarro horas depois, fizeram com que eu perdesse respeito por mim e a pensar que de tão livre eu poderia fazer isso quantas vezes quisesse. O resultado foi a atitude infantil de fumar escondido, por vergonha dos que haviam apostado em mim, haviam aguentado meu mau humor, meu desespero, meu sofrimento.
O dia nove de janeiro de 2013 representa um marco, uma data em que repito o feito, desta vez acompanhada de um diagnóstico de alguns problemas físicos, que não posso ignorar.
Estou me sentindo ameaçada e fumar não me parece mais ser algo que eu possa continuar a fazer. Estou amedrontada e ciente de que não posso mais tentar. Espero encontrar o que preciso dentro de mim por que fora de mim tenho o apoio, de novo, das pessoas que me amam e que não quero decepcionar.
Os primeiros cinco dias sem fumar são algo de que não consigo lembrar direito. Tenho consciência de ter feito tudo o que precisava fazer, mas os sentimentos são nebulosos.
 Confesso que tramei mil formas de driblar a mim mesma, que pensei em mil formas de dar uma tragadinha aqui e ali para acabar com o calvário em que eu estava metida.
Falo de calvário de boca cheia mesmo, por que o que vivi foi o inferno puro e simples. No quinto dia tive pena dos que me rodeavam, por que eu estava escabelada, desnorteada, com vontade de matar alguém. Chorei amargamente por diversas vezes e perguntei à minha nora Angélica se alguém já tentou se matar por causa de abstinência. Ela sorriu e, coisa bem do jeito dela, um tempo depois, ela falou que sim, que poderia acontecer. Carinhosamente completou dizendo que o cigarro não merece tudo isso e que eu deveria mudar o foco. Quando ela falou isso, eu já havia tomado umas gotinhas milagrosas, motivo pelo qual, pude ouvir e analisar bem o que aquilo significava. Desde aí, melhorei.
Tive vontade de fumar muitas vezes, mas, mesmo que tivesse acesso a uma tragada eu a recusaria. Não tenho mais medo de morrer de falta do cigarro, já posso pensar em outras coisas bem agradáveis.
Passamos uns dias na praia, onde encontrei gente lutando contra o vento para acender seus cigarros, tomei chimarrão com uma vizinha fumante e resisti.
Minha rotina inclui remédios agora, coisa que para mim é novidade. Comecei a tomar um antidepressivo uns dias antes de parar de fumar e tenho um vidrinho de gotas ansiolíticas que encaro como uma bengala. Preciso saber que as tenho, mesmo que não use.

Ufa! Dessa me safei! Nunca mais, nunca mais, nunca mais! Nem uma tragadinha.






RESUMO DE FEVEREIRO
                Quem para de fumar deixa sempre a tarefa para depois das festas de final de ano e para depois da praia. Eu passei o Natal e o Reveillon fumando, bem ciente de que eram os últimos estertores do hábito que me acompanhou por tanto tempo.
                Cigarro combina com café, chimarrão, cerveja e cadeiras de abrir, concordas? Quem larga o cigarro toma a providência de deixar todas essas coisas gostosas também, para não cair em tentação. Isso eu não fiz. Continuei fazendo tudo como antes, só não caí na armadilha de comer balinhas, mascar chicletes, tentando substituir uma coisa pela outra, por isso, no final de fevereiro ainda não havia engordado nada. Mas o pior estava por vir...
                Cadeiras de abrir, cigarro e praia, combinação perfeita! Enfrentei valente essa bomba como um desafio que, confesso, temi não conseguir ultrapassar.
Chegamos à orla, instalamo-nos e fomos à praia. Nordestão a mil, imaginei o trabalho que teria tentando acender um cigarrinho. Lembrei-me de como a gente faz isso: procura um escudo que pode ser humano, pode ser o guarda-sol, pode ser a mão em concha e tenta acender o isqueiro uma, duas, três, quatro vezes, até ficar com o polegar machucado. Aí acenda o dito e tenta fumar na ventania, tenta! Juro que senti um alívio imenso saber que eu não teria que passar por isso. Constatei que, ao invés disso, teria que correr atrás do Théo e da Cecília, meus netos de um e oito anos respectivamente. E corri e não tive falta de ar; corri e não tive que parar pra descansar; e, incrível, corri e ri muito, tudo ao mesmo tempo.
                Enfrentei corajosamente muitas cadeiras de abrir, algumas cervejas, muitos cafezinhos e descobri que era capaz de fazer tudo e sobreviver. Juro que me diverti à larga e me lembrei do cigarro só umas cinquenta vezes. Ufa!





                RESUMO DO MÊS DE MARÇO

O mês de março parece ser o início de uma vida normal sem férias sem carnaval e sem muitas festas. Frequentemente referimo-nos a isso dizendo que agora sim, começou o ano. Pois foi em março que realmente me senti livre da muleta que me amparou, ou pensei ser um amparo. Foi quando senti haver jogado fora algo que me torturou e me fez sentir culpada.
                Referi-me a figura da muleta por que quando viciados, não conseguimos desempenhar a vida sem recorrer ao que nos vampiriza, ao que nos consome. O prazer que o vício proporciona é tão efêmero, que nos valemos dele demasiadas vezes. Sabemos perfeitamente o que estamos fazendo, o que torna inócuo ouvir falar dos malefícios do tabaco e do que ele está nos causando, a não ser que estejamos frente ao cardiologista, olhando para chapas de RX.
                O que toca alguém que fuma é saber que daqui a pouco a respiração melhora, que a pele vai simplesmente clarear, que a presença entre as outras pessoas passa a ser algo muito mais agradável para todos, que não precisa mais afastar-se por vergonha, por não querer e não poder incomodar. É muito forte ter que frequentar fumódromos. É humilhante...
                Em março, conviver passou a ser pura fruição. Tive momentos tranquilos, quando sentei por longos períodos com amigos, minha neta e meu neto, a família, sem ter que me afastar deles e ir em busca de cigarros nas sacadas, no meio da chuva, no isolamento.  
                A conquista desse tipo de liberdade é algo que não tem preço. A conquista dos sabores, cheiros e sutilezas, que passavam desapercebidos pelos meus sentidos, agora fazem parte da minha vida. O difícil agora é parar de comer e ficar dentro do razoável, ou pode-se suspeitar de estar começando um novo vício. 





– RESUMO DE ABRIL

                Abril foi um mês de intensas atividades. Comemoramos o mês inteiro o aniversário da Academia Passo-Fundense de Letras que, afinal, estava fazendo 75 anos, além de todas as outras atividades para dar conta. Correu tudo tão bem, que pensei passar o mês sem sentir falta de fumar.
                Descobri que nunca podemos nos sentir livres de um vício, principalmente quando acontece algo inusitado. Em abril sofri um aborrecimento que, à primeira vista, pareceu importante. Fiquei com muita vontade de fumar, enquanto remoía o que me incomodava. Creio que consegui conter meu ímpeto, com a ajuda de amigos.
                Tive prova de que devemos falar da nossa insegurança, quando comecei a receber manifestações de afeto e de apoio. O que me parecia grave, começou a delinear-se e pude dimensionar o tamanho do que e de quem estava me incomodando. Voltar a fumar seria como que o aniquilamento da força de vontade dos últimos meses.
                Confesso que foi um dia difícil, um dos mais difíceis da trajetória de ex-fumante. Acordar no outro dia e perceber que eu havia conseguido de novo optar por mim, me fez lembrar de que parar de fumar é uma atitude subjetiva, intransferível e que sou livre para fumar se quiser.  Se não fumo é por que não quero mesmo.
                Agora tenho internalizado que não fumar é um ato de liberdade e que só as pessoas que gostam de mim têm direito de abalar as minhas estruturas, para tornar-me mais forte, mais resistente. E livre.






DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE – Resumo de maio

                Em maio encontrei uma amiga e um amigo que também deixaram de fumar. Ele estava ótimo, disse que nem sofreu muito, que olhou para os últimos cigarros e disse que não queria mais. Pronto, não fumou mais! A minha amiga havia engordado muito, por isso, estava meio deprimida.
                Propus-me a não dar conselhos aos que fumam, por lembrar o quanto isso me incomodava, mas a minha amiga já havia parado e precisava de uma ajuda para não voltar ao vício. Falamos sobre comida saudável, sobre beliscar doces, sobre fazer exercícios físicos. Aí foi que eu não pude ajudar. Sou aquele tipo que não suporta puxar ferros, erguer pesos, suar em academias e caminhar em nossas ruas mal cuidadas e passeios perigosos.
                O ganho de peso é um fator fácil de desistência, por isso, conversamos muito, minha amiga e eu. Vamos as duas procurar alguma modalidade de ginástica, dança, seja o que for para exercitar o corpo. Concluímos que devemos achar algo com método, com atividade que nos agrade. Acho que é como comer e coçar...
                Tive a sensação de que os homens largam do cigarro com mais facilidade e não se importam muito com o ganho de peso. As mulheres detestam engordar e sabem que demora para emagrecer, a não ser que se tome alguma iniciativa eficaz, mas voltar a fumar é coisa que está descartada.
                Pensando bem, mesmo mais gordinhas, estamos muito mais felizes e sabemos que podemos incorporar a essa felicidade as maravilhosas endorfinas que a atividade física nos proporciona.  Vamos lá!
                 
               


DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE

                Nos primeiros quinze dias de junho tivemos de tudo em Passo Fundo. Foram dias tensos, mas que trouxeram muitas novidades. Já estamos acostumados com a cara da adversidade, mas não perdemos nossa vocação para promover o bem comum. Vou procurar elencar o que lembro, para que apreciemos o fato de que o bom superou o ruim, pelo menos em números.
                Tivemos a destruição de uma vitrine por uma bomba caseira; um bebê de onze meses colocou uma pedra de crack na boca; índios bloquearam estradas; o preço da areia para construção subiu; goteiras destruíram documentos do Conselho Tutelar; câmara autorizou contratação de médicos; houve muitas ações pelo Dia Mundial do Meio Ambiente; vacinamos contra a pólio; foi desbaratada uma quadrilha que facilitava emissão de CNH; vendemos horrores para os namorados; disseram ser possível universalizar o tratamento de esgoto; moradores da Schisler marcaram os postes sem lâmpadas; contrataram pediatras; começou a reforma do Lauro Kortz; o Clube Juvenil comemorou 100 anos; interditaram o Ginásio Teixeirinha; o relógio da Catedral parou; perdemos duas pessoas para o H1N1 no estado; aterro de Marau teve licença vencida; interditaram uma casa para idosos. Ufa!
                Sem polyanismo comemoro o saldo positivo e resisto ao datenismo justiceiro com relação ao negativo.  Somos uma cidade muito parecida com outras, mas é aqui que vivemos e é aqui que queremos ser felizes. Só podemos agir aqui e agora, sem perder o que nos rodeia de vista.
                Proponho um brinde de água fresca pela primeira quinzena de junho e pelos cinco meses que não fumo. Pela primeira vez faço uma retrospectiva respirando bem.




DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE
            Parar de fumar é motivo de alegria, mas nem sempre a primeira tentativa, nem a segunda e, creia, nem a terceira é bem sucedida.
            É necessário que se fale sobre recaídas, por serem elas que frustram não só a quem parou de fumar, mas à família e amigos. No caso de termos filhos é visível a decepção.
            É avassalador ver a reação das pessoas, quando nos pegam fumando de novo. Das vezes que parei de fumar a decepção dos meus foi causa de um enorme sofrimento.
            Agora já sei de algumas coisas, que podem ajudar a quem quer parar de fumar e para os que acompanham o ato de heroísmo. Por exemplo:
 . Não é um problema de caráter se você volta a fumar. Você só não conseguiu ainda.
 . Parar de fumar é um problema seu e voltar a fumar também.
 . Cada vez que você para, você tem mais experiência, portanto, muito mais chances de deixar o hábito de vez.
 . Não caia na armadilha de fumar escondido, por que, além de você estar se poluindo e acabando com a sua saúde, sentirá um enorme mal estar por estar mentindo.
 . Comece a pensar com seriedade, de novo em como você quer estar bem, ter paladar, acabar com o vampiro que suga sua autoestima e sua saúde. Passe de novo uma noite toda em claro, só pensando nisso.
 . Tome uma decisão e experimente não contar a ninguém. É maravilhoso o gostinho de ter um segredo tão importante com você mesmo (a). Coragem, vale muito a pena!




DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE

                A decisão de parar de fumar, geralmente, vem de dentro de um consultório médico, quando estamos estabelecendo uma relação de confiança e não de cobrança e de medo. Reputo este momento como um dos mais importantes, por iniciar-se uma relação médico-paciente fundamental para alcançar o objetivo, tanto de um, quanto de outro.
                Muitas vezes eu não voltei ao consultório por medo de ter que fazer exames e encontrar “alguma coisa”, por que “quem procura, acha”. Neste momento, tudo depende da sensibilidade do profissional, pois pedir o tal RX do tórax, algumas vezes não deve acontecer na primeira abordagem. Eu fiz RXs que deixei nas clínicas sem coragem de buscá-los.
                Quando encontramos um médico sensível, somos capazes de querer realmente parar de fumar por ainda não termos sintomas de males maiores, sendo este o melhor momento. No caso de já estarmos doentes, devemos ouvir que, mesmo comprometidos, precisamos de ajuda para recuperar a saúde. O olhar tranquilizador e a confiança que se estabelece neste momento, são a pedra fundamental para se começar algo tão difícil.
                Ninguém pense que o remédio, caso seja receitado, seja capaz da façanha de determinar a cessação de um vício. Ninguém pense que está se iniciando um processo fácil. O que eu vivi nos primeiros dias é indescritível, mas ultrapassá-los foi um ato que trouxe junto uma sensação de respeito próprio, também indescritível. Tenho certeza de que o meu cardiologista tem uma parcela enorme de mérito no processo de parar de fumar. Senti que o pedido partia de um ser humano para outro, em uma incrível troca de emoção e empatia, o que foi fundamental.
                Portanto, quem quer parar de fumar deve procurar um médico em quem confie e, se não encontrar a empatia necessária, procure outro. Há um protocolo de ação contra o tabagismo, que é conhecido pelos médicos, inclusive na rede pública.
                Coragem, você vai precisar de muita! E um abraço solidário de quem torce por você.
               



DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE

                A legislação brasileira proíbe a exposição de crianças e adolescentes ao cigarro,e ao álcool, as drogas mais comuns. O país dispõe da Lei Federal 8.069/1990, que proíbe a venda de cigarros a eles, mas nossas crianças e adolescentes não encontram dificuldades para adquirir o produto.
                Além da oferta escancarada e da falta de fiscalização, nossos filhos convivem excessivamente com pessoas que fumam. O número de fumantes ainda é grande e fuma-se cada vez mais cedo.  
                Eu sofro o remorso de haver mostrado aos meus filhos algo tão prejudicial. Lembro das inúmeras vezes em que, envergonhada, procurei desculpas para não atender ao pedido das crianças para que eu não fumasse.
                Tenho um filho que fuma, pelo que me penitencio, mas sei que chegará a hora dele de encarar a necessidade de deixar o tabagismo. Sinto que a minha decisão de parar está ajudando para que tenha a coragem necessária para tomar a decisão dele.
                Devo agradecer à escola onde meus filhos estudaram, pelas atividades de valorização da vida que desenvolveram com eles, o que teve um peso enorme para que escolhessem ser saudáveis. A escola é a grande aliada dos pais na tarefa de educar e de cuidar. Quando a escola tem boas políticas, professores marcantes e olhar atento, nossa tarefa de educadores é potencializada.
                Dei um tremendo mau exemplo às minhas crianças, mas sei que não o fiz por falta de caráter, mas por fatores difíceis de contornar. Vejo-os orgulhosos de mim e muito mais tranquilos com relação à minha saúde. Há alguns anos assistiram ao pai fazer o mesmo, sem que eu o acompanhasse. Teria sido muito mais fácil se tivéssemos parado juntos.
                Não vou perder meu tempo com lamentações, por que não é disso que a minha família precisa, por que, espero, não tenha parado tarde demais. O tempo dirá!
                 



DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE

                Tive a oportunidade de conversar esta semana com uma mulher que admiro. O facebook foi o veículo usado para um bate-papo alegre e cheio de significado. Tudo começou com uma pergunta dela: “Você engordou quantos quilos?”. Compreendi que ela estava falando da minha abstinência de cigarro.
                Respondi que devo ter engordado um ou dois quilos e fiz um arrazoado das medidas que usei para não engordar. Ela contou que não fuma há dois meses, faz tudo certinho, come de três em três horas só coisas saudáveis e... engordou. Aí compreendi que as coisas funcionam diferente de uma pessoa para outra. Minha tese é boa, mas não infalível.
                Sem grandes e preocupações com o peso, mas ocupada com a saúde, contou-me a grande novidade, aquela que está movimentando a sua vida. Além de não fumar: ela está correndo, e adora fazer isto! E faz musculação! Fiquei claramente com pena de mim, que ainda não comecei nada disso, mesmo sabendo que preciso muito. A lei da gravidade nunca se mostrou tão evidente como depois dos sessenta e tantos...
                Ela não poupou comentários de como se sente bem e disse ser MARAVILHOSO correr.   A uma altura da conversa convidou-me para correr com ela, e mais, disse que me leva pela mão, numa clara manifestação de carinho e espontaneidade. Tive a sensação de ver as endorfinas da minha amiga falando comigo.
                Como era de esperar, dei um jeito de me sabotar, coisa que sempre faço quando se trata do quesito exercício físico. Mas, acho que tenho conserto. Acredito em mim. Vou conseguir. Se consigo não fumar, consigo qualquer coisa. Minha amiga terá companhia! Um dia... A lei da gravidade é inexorável! Putz!





DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE

                Fomos almoçar na casa da minha filha, quando fiz um comentário acerca da água mineral que estava sendo servida: “Esta água tem muito sal?”. Minha filha e meu genro olharam-se e sorriram. Perguntei o porquê do riso e minha filha respondeu: “Você sempre se preocupou com a qualidade da alimentação, mas fumava o dia todo.”. Fiquei ali, parada e quase derrubei a água.
                Dei razão a ela. Tivemos uma família grande o Domingos e eu. Primamos por nunca faltar nada de que eles precisassem para que fossem saudáveis. Conto até hoje que, porcarias tinham hora e dia. As lancheiras iam à escola com sucos, frutas e pão. Essa filha do sorrisinho era quem mais reclamava das maçãs que comia no recreio.
                Meus filhos nunca demonstraram que me achassem incoerente, todavia , lembro que cada um a seu tempo, me pediu para não fumar mais. É claro que passei muitas horas da vida arquitetando estratégias que contemplassem o que os filhos esperavam de mim, mas, aproveitava cada revés, cada alegria, cada festa para adiar o projeto. Tudo era motivo para fumar. Eu pensava até que, devido a trabalheira que a família demandava, eu merecia parar de vez em quando para uma tragadinha.
                Eu aguento as risadinhas dos meus queridos, por que, agora sei a dimensão da preocupação deles por mim. Agora vi a felicidade deles e a forma como acompanharam o processo de desintoxicação pelo qual passei. O carinho que veio dos filhos foi o fator mais forte de perseverança.
                Será que um dia a imagem de mãe fumante se apagará da memória dos meus filhos? Acho que não! Mas isso não é o mais importante. O mais importante é , agora, dar um exemplo de tenacidade e mostrar que, apesar dos estragos, vale a pena cuidar de verdade da saúde.
                Antes que me esqueça, comecei a caminhar, tá? Podem cobrar mais atividades físicas daqui pra frente.
               
               


DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE

                Lembro-me de sempre ter cantado na minha vida. Quando pequena como aluna de colégio de freiras, cantávamos em sala de aula, na igreja, em eventos cívicos.
                Quando adolescente cantei por um tempo em um coral quando soube que eu tinha uma voz boa, acho que era soprano, ou não tanto. Mas eu cantava “fininho”. Minha voz era clara e alcançava muito bem notas altas.
                O sentimento de amor à pátria é algo forte em minha trajetória, coisa trabalhada e estimulada por parte da escola, tanto da católica, quanto da metodista, as quais frequentei. Cantávamos o Hino Nacional com emoção, com lágrimas nos olhos, coração batendo forte. Esse sentimento me acompanhou até aqui. Agreguei à minha emoção, o Hino do Rio Grande do Sul, cuja entoação é obrigatória em atos públicos.
                O diferente nisso tudo, é que, com o passar dos anos, não cantei mais “fininho”, perdi a capacidade. Lembro de ter que mudar o tom para um mais baixo, tamanha era a dificuldade com as notas altas. Frequentemente, conforme o esforço, a garganta coçava e a tosse era inevitável.
                No dia primeiro deste mês, participando de um ato cívico pela Semana do Município, supreendi-me cantando como antigamente.  A voz saía clara e sem ameaças de coceira e tosse. Aí eu soube. É claro que recuperei a voz, ora! Parei de fumar e isso liberou minhas cordas vocais de tanta sujeira e cansaço. É claro que minha voz estava cansada.
                Pois eu cantei bem alto, satisfeita por reconhecer a voz que é minha. Ela pode não ser linda, mas é minha e quero continuar ouvindo-a sem estragos desnecessários.
                Uma coisa continua sem mudanças, que é meu espírito cívico, meu amor ao Brasil. Frequentemente minha voz fica embargada, mas é de emoção, o que é normal e perfeitamente saudável.





DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE

                Nasceu Vicente, nosso netinho. Ele é o terceiro, depois de Cecília e de Théo. Como das outras vezes, o fato de ser avó causou-me uma emoção capaz de me fazer passar o dia todo com lágrimas nos olhos. Não economizei nenhum sentimento que apareceu junto com o nosso bebê. Quando fico assim, valho-me dos livros para dar uma equilibrada.
                Fui procurar um texto de que gosto muito, que fala sobre a relação dos velhos com as crianças. Trata-se de Elogio da Loucura de Erasmo de Rotterdam, escrito em 1523. No livro quem fala é a loucura e ela fala assim: “...os velhos apreciam muito a companhia das crianças, e as crianças a companhia dos velhos; pois os deuses gostam de unir os semelhantes. De fato, se excetuarmos as rugas e o número de anos, próprios da velhice, há dois seres que se assemelhem mais que o velho e a criança? Ambos têm cabelos escassos, uma boca sem dentes, um corpo raquítico, gostam de leite, gaguejam, tagarelam; a tolice, o esquecimento, a indiscrição, tudo contribui para formar entre essas duas criaturas uma semelhança perfeita.”
                Tirando a falta de dentes e o corpo raquítico, entendo o que a loucura quer dizer. É no exercício da velhice que aprendo a ser velha e melhor se em companhia de crianças. O que seria de mim se tivesse que pensar o dia todo sobre a seriedade da vida? Como seria a minha vida se não ficasse horas ouvindo os bebês falando errado, repetindo e repetindo o que eles falam, mesmo sem saber o que querem dizer? Definitivamente, a convivência com as crianças permite que a gente esqueça a proximidade da morte e isso Erasmo enfatiza no livro de forma hilariante. Acredito que a leveza deve acompanhar-nos quando somos avós.
                 Uma coisa deveria ser garantida aos avós e ser afixada nas paredes, como no aviso de não fumar: “É proibido chamar a atenção dos bebês quando falam errado. Só é permitido corrigi-los quando tiverem cinco anos.” 
                Bom, resgatado o trecho do livro que tanto amo, preciso resgatar também a lembrança de que posso ficar horas e horas com Vicente no colo; de que a minha roupa sempre estará em condições de pegar um bebezinho; de que não preciso mais carregar chicletes na bolsa, afinal, eu agora não fumo mais. Dei-me conta agora de que passo dias sem lembrar de que o cigarro existe. Sou uma avó louca, mas muito cheirosa!
               



DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE

                Olhar para o chão da nossa cidade é coisa desagradável. O que é grande, vemos com facilidade, mas o pequeno, às vezes, é mais desagradável de ver. Refiro-me ao chiclete grudado nas calçadas. Que coisa mais horrível! Eu odeio isso há muito tempo. Assim como você já tentei desgrudar essa coisa dos sapatos mais de uma vez.
                Convido-o (a) a olhar para baixo.  Esquece das péssimas calçadas, mas olhe as manchas de chiclete que encontramos em profusão. Feio, não é?
                Em Singapura largar chiclete na rua é motivo para levar chibatadas e cobrança de multa, sem falar que a venda dele só é permitida em farmácias, contra a assinatura de um termo de compromisso de descartá-lo de forma adequada. Isso é civilização! (Esquece que é autoritário, por que quem impõe sua sujeira aos outros, também é autoritário).O dinheiro arrecadado para limpeza da cidade, ao invés de pagar quem limpe chicle grudado na rua, é usado para plantar flores e enfeitar a cidade.
                Tenho, portanto, aversão por chiclete grudado no chão, mesmo que adore mascar essa coisa gosmenta que não sei de onde sai. Os sabores artificiais são muito gostosos, ou não mereceriam tanta pesquisa e propaganda. Viramos reféns desses sabores e é tarefa heroica nos desvencilharmos deles.
                Quando fico indignada, costumo pensar, que todos contribuímos de alguma forma, para que a situação que me deixa furiosa seja construída. No caso da sujeira da cidade, ocorreu-me que nunca joguei chiclete em qualquer lugar, nem permiti que meus filhos jogassem, mas, devo fazer um enfático mea culpa, por que joguei algo bem mais nojento por aí.  Já desrespeitei toda a comunidade.
                Joguei bitucas de cigarro durante anos por todos os lugares, pelo que peço desculpas. Se eu vivesse no Rio de Janeiro hoje e ainda fumasse, pagaria mais de cem reais por cada bituca de cigarro abandonada. Putz! Como já fui inconsequente!
                Conheci uma escola onde o pátio é um mosaico de chicletes de várias cores, a maioria preta de sujeira. Enxerguei a escola como terra de ninguém, onde cada um faz o que quer, sem que haja o mínimo de urbanidade. Aliás, quando estudei no Notre Dame, urbanidade era motivo de nota no boletim. A categoria mostrava como nos comportávamos em ambiente coletivo.
                Que tal se alguém nos desse uma nota pelo nosso comportamento coletivo? E se a avaliação fosse feita quando ninguém estivesse olhando? Já estou batendo no peito...





DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE

                Sinto-me ainda no clima da Jornada Nacional de Literatura. Dentre muitas atividades de que participei, uma das mais emocionantes e significativas foi o lançamento do livro O Imortal Moacyr Scliar, com trabalhos selecionados no V Concurso Literário da Academia Passo-Fundense de Letras. O trabalho foi coordenado pelas acadêmicas Dilse Piccin Corteze e Elisabeth Souza Ferreira.
                Compareceram ao lançamento os estudantes que escreveram resenhas, biografias, textos criativos e poemas sobre Moacyr Scliar, assim como as professoras que impulsionaram seus alunos e, principalmente, pais. Esses sempre me inspiram!
                Pelo jeito feliz daqueles pais em olhar seus filhos recebendo menções honrosas, subindo ao palco do Café Literário e depois autografando os livros que eles produziram, podia-se perceber que eram pais especiais. Em minha trajetória de voluntária da Escola de Pais do Brasil, pude conhecer aqueles que educam para a emancipação. E alguns deles estavam lá, aplaudindo seus adolescentes lindos.
                Filhos educados com muitos aplausos e poucas críticas são mais seguros e felizes. Não temem mostrar as coisas que fazem por que são encorajados por adultos que não só os amam, mas são inteligentes. E inteligência independe de quantos anos se frequenta a escola. Os pais inteligentes empurram pra frente e confiam.
                Quando tudo acabou percebi que estava em um lugar mágico. A Jornada é feita de lonas, de pavilhões. No entorno havia banheiros químicos e no Portal das Linguagens, banheiros convencionais. Esses eu nunca encontrei sujos, juro! Colocaram muitas lixeiras em todos os lugares, que foram usadas, não à perfeição, mas de maneira satisfatória e encontrei pouquíssimos toquinhos de cigarros no chão.
                Estamos ou não estamos evoluindo? Estamos cuidando melhor de tudo, não só do que é nosso. Parabéns para a Literatura que foi a rainha da semana e parabéns para nós que a reverenciamos.
               





DIÁRIO DE UMA EX-FUMANTE

                Há assuntos que vêm à baila e que mexem conosco. Hoje no Fantástico trouxeram o projeto de lei que ainda dorme em algum lugar do senado e que se chama Lei da Palmada. Já discuti este projeto em várias instâncias e sei que nem de longe é unanimidade.
                Ao ouvir o povo a respeito da palmada lembrei de que há alguns anos era comum fumar em qualquer ambiente. Tínhamos professores fumantes, colegas  fumantes e, apesar de desagradável, não era estranho o fato de fumarem em aula. Lembro que nunca fui proibida de fumar em qualquer emprego que tive.  Foi necessário que se fizessem leis para que acabasse  a farra do cigarro em lugares fechados.
                A proibição ao cigarro foi contestada, argumentou-se que a lei feria a liberdade individual, o direito de exercer uma atividade que não causa alucinação, nem diminuição de capacidades físicas. Pensou-se na época que a lei não “pegaria”. Ela foi taxada de desnecessária e autoritária.
                Há vinte anos, em todos os lugares havia avisos de Proibido Fumar. Hoje podemos até nem ver aviso algum, mas incorporamos à nossa vida o que a lei trouxe para mudar nossos hábitos e nossos conceitos sobre o assunto e vivemos agora com muito mais limpeza, pelo menos no ar, por que o chão em alguns lugares é um horror.
                Com a lei da palmada, penso, acontecerá a mesma coisa. A punição física é perniciosa, ela fere o que uma pessoa tem de mais caro que é sua integridade física e moral, costuma descambar para a pancadaria e não faz bem nem para quem bate, nem para quem apanha.
                Espero que daqui a alguns anos a gente possa contar às pessoas que lá por dois mil e treze as pessoas ainda batiam em crianças e, pior, com o intuito de educa-las. Espero que as pessoas sabedoras desse fato fiquem muito horrorizadas e não haja mais necessidade de que conselhos tutelares interferiram no direito que cada família tem à privacidade.
                Sei que é polêmico o que estou trazendo, mas acredito que há leis civilizatórias e necessárias quando não conseguimos evoluir sem um empurrãozinho. 
               
               










quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Hoje o dia foi pesado. Temo que não entendam o que estou sentindo e digam, de novo, que não tenho razão para tristeza, que devo encarar tudo com mais serenidade. Não suporto que me tratem como alguém que não sabe o que sentir, como se fosse possível sentir o que os outros acham mais adequado. Eu estou morando em um lugar que ainda é estranho pra mim. Saí de uma casa que eu contruí, com tudo o que isso implica: conseguir financiamento, negociar com engenheiro (coisa fácil no meu caso, por que meu compadre Fernando é ótimo), contratar construtor, comprar tudo, fazer os pagamentos, correr para a construção com o leite pingando dos seios por haver dado à luz à Flávia, correr de volta pra casa, atender as crianças, pegar as crianças no colégio, no vôlei, no colégio de novo, dar de mamar e, acredite, antes de terminar a casa, estar grávida de novo. Sabes quanto tempo demorou pra construir a casa? Seis meses! Isso mesmo! Mas, imagine o que foi nos mudarmos para a casa nova, linda, sólida, com dez anos para pagar e dívidas previstas para dois anos. Foi maravilhoso, já que a grande sala, dez degraus mais baixa, serviu de campo de futebol para os filhos e os primos por todo o período de dívidas, para só então, comprarmos sofás e tapetes. Tivemos o Cássio alguns meses depois da mudança e seguimos a vida de uma forma extremamente feliz. Tivemos episódios de coqueluche em todos, varicela em todos, cirurgias de extração de amigdalas e aquela carninha no nariz em todos, acredite! As crianças brincaram muito, com terra, água, cachorro, amigos, primos e com avós. Meus pais, quando minha mãe ficou doente foram morar conosco e foi ótimo. A vida com velhos e crianças, quando bem vivida é muito boa. Meus pais adoravam meus filhos e, principalmente, o Domingos, que foi carinhoso, cuidadoso e presente na vida deles. Minhas crianças jamais desrespeitaram os avós, pelo que agradeço até hoje. Enfrentamos tudo o que estava reservado, como doenças, carências, faltas de ar, trabalho pesado, noites em claro, com a cabeça erguida e sem fugir sequer um minuto do que tinha que ser feito. Aos poucos tudo foi se acomodando. Os filhos cresceram, começaram a morar por conta própria, meus pais faleceram e, após trinta e quatro anos, encontro-me sentada no meu quarto, escrevendo, enquanto o Domingos, cansado do dia de trabalho, está deitado no sofá. Daqui a pouco vamos jantar e, com sorte, alguém vai aparecer na nossa nova casa antes de dormirmos. Hoje eu não quero pensar que estou fazendo tempestade em copo dagua, que sou uma pessoa afortunada por que não me falta nada. Quero sentir saudade da minha juventude, mesmo que minha velhice seja feliz; quero sentir saudade da minha casa, mesmo que onde moro seja ótimo; quero ter o direito de chorar sem pruridos e quero dizer com liberdade das minhas dores e das minhas dúvidas, sem que isso seja minimizado por pessoas que se pensam mais sábias do que eu. A vida não foi feita para sábios, mas para pessoas que sentem. Sou perfeitamente capaz de ser feliz, mas não o tempo todo, ou seria uma babaca, ou boba alegre. Eu sinto falta de umas pessoas das quais não tenho mais a companhia, mas não das pessoas que se tornaram, mas das pessoas que eu pensei que fossem e nem de longe fazem jus ao que elas pensam que são. Sofri um processo de tortura nos anos mais vulneráveis da minha vida e por uma pessoa tão medíocre que, cá pra nós, tenho que dar razão a quem diz que o diabo sabe pra quem aparece. Essa pessoa sabia que causaria o estrago que causou, mas acredito na lei de causa e efeito e, cá pra nós de novo, eu não gostaria de ter sido a causadora do sofrimento que ela causou em mim. Acho que não conseguiria dormir o resto da vida, até por medo do retorno. Hoje a coisa tá braba por aqui. Acho que vou tomar um chá, conversar com o meu amado marido, que fica muito preocupado quando estou assim. Daqui a pouco ligo pro Théo e pra Cecília e fico boa de novo. Peço desculpas ao Cássio e à Angélica por choramingar de vez em quando, mas quero que saibam, que estou feliz, muito feliz por saber que, graças a eles, ainda tenho acesso à casa que, tenho certeza, verá uma linda família desfilar por seus cômodos mais uma vez. Ufa!

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Querido Vicente

Estamos aqui, sua irmã Cecília, seu avô Domingos e eu, sua avó. Acredito que não conseguiremos dormir de tão ansiosos pela tua chegada. Amanhã de manhã você vai nascer e encher nossa vida de alegria. Sua mãe estava ansiosa à tardinha e seu pai também. Sua avó Vilma já havia chegado para acompanhar esta noite, dar carinho à sua mãe e estar junto dela quando você nascer. A Rocheli veio de Porto Alegre, onde ela mora com o Bruno, seu tio, para fotografar seu nascimento. Ela é muito boa nisso e é uma tia espetacular. Espere só para ver que colinho ela tem. O Théo adora dormir no colo dela. Aliás, o Théo vai ensinar a você muitas coisas. Ele está com quase dois anos, é malandro e já sabe muitas coisas como: mexer no IPad, no telefone, colocar os dedos nas tomadas, abrir tudo o que encontra fechado, quer dirigir principalmente o fusca do Tio Ricardo. Outro dia ele olhou para a barriga da sua mãe, que estava imensa e pediu para tirar, tirar, tirar a barrigona. Acho que você é um gurizão de tão grande que é a barriga da Vanusa. É uma pena que seu avô Alcides não esteja mais aqui, mas você tem muitas pessoas para te amar, por exemplo: Amanhã eu volto a escrever pra você. Estou muito cansada, meu amor.
Agora já o conheço, Vicente! E você é lindo, saudável, grandão. Dizem que você chorou forte ao nascer e que pesou três quilos e quinhentos e cinquenta gramas, olha só! A Cecília dormiu bem, mas ontem à noite a supreendi chorando muito, por que ela encontrou o presente que você vai dar pra ela e olhou o que era e leu o cartão. Ela estava tão nervosa, que telefonou para a mãe, que a tranquilizou e disse que tu não te importarias com isso. Fiquei emocionada com o caráter que a Cecília demonstrou ter, aliás, isso está acima da beleza e de qualquer outra coisa. Mas, quero contar pra você o que está acontecendo agora, na tua família, na tua cidade, no teu país. O Ricardo é funcionário da Receira Federal, há muitos anos e também dá aulas na Faculdade de Direito da UPF, também há anos e é um homem correto, simpático e bom, extremamente bom. A Vanusa é enfermeira e funcionária do Hemocentro da cidade, muito competente e especialista em sangue. Ela é muito querida por todos que a conhecem, tendo como marca muito forte o sorriso que ela espalha por aí. A Cecília estuda no Colégio Conceição, no quarto ano e adora ler, mexer no tablet, e tem um celular há cerca de um mês, com ship. É uma menina linda, amorosa e feliz e estava louca pra te conhecer. A tata Salete é um amor de pessoa e ficou muito emocionada quando contei que você havia nascido e estava bem. Seus padrinhos são uns amores: Daniele e Jone, Cássio e Angélica são seus tios e agora padrinhos. Ficaram muito emocionados quando souberem que haviam sido escolhidos. Todos ajudaram a arrumar o quarto em que você vai crescer e ser feliz. Você tem muitos outros tios e tias, que vou enumerar aqui: Eliza e Iuri, pais do Théo; Flávia e Paulo, que moram em São Paulo; Bruno e Rocheli, que moram em Porto Alegre; Daiane, Ana e Rudi, que moram em Camboriu. Tens muitos primos também, olha só: Ane e Luis Henrique, Lucas e Théo, com quem você vai aprender muita coisa e com quem vais brincar e ser feliz.
A nossa cidade, Passo Fundo está de aniversário nesta semana, está fazendo 156 anos. Estamos festejando muito, por que é uma cidade em pleno vigor e é um polo na medicina, na educação e em serviços. Temos a Jornada Nacional de Literatura, na última semana deste mês, quando vou lançar um livro no qual há quatro contos escritos por mim, o que me orgulha e alegra muito. 
Peço desculpas por não ter concluído esta carta antes, mas ando muito ocupada, nos mudamos da casa onde vivemos a vida toda e moramos em um apartamento, o que vem ocupando minha cabeça. Preciso imaginar como vou deixar este lugar tão meu quanto o outro. Confesso que às vezes tenho saudades do lugar onde vivemos tantos anos, mas acredito que conseguiremos ser felizes aqui. Contamos com tuas visitas, com as festas do pijama que faremos, com as brincadeiras e pulos em cima da minha cama. O vovô é louco por crianças e, certamente, será tão feliz contigo quanto sempre foi com Cecília e Théo. 
Eu quero oferecer pra ti todo o meu amor, toda a minha dedicação e prometo que, além de mim, terás um vovô que fará de tudo para que sejas feliz. 
Seja bem-vindo, Vicente Rizzo Frosi!
Viva o Vicente Rizzo Frosi!. 

quarta-feira, 17 de abril de 2013


O significado de ser imortal.
                Todos nós somos seres sociais, por isso procuramos conviver com pessoas.  Formamos grupos, associações, clubes, onde podemos ser sujeitos e reconhecer a subjetividade dos nossos pares.
                Geralmente esses grupos sociais são formados por pessoas que pensam muito parecido, que comungam de um mesmo ideal e, cada um, a seu modo, imprime nesse grupo sua marca e sua atuação. Já fiz parte de muitos grupos de trabalho voluntário e, creio, esse trabalho interfere na qualidade de vida de toda a sociedade.
                Desde o ano de dois mil e dez faço parte de uma organização para a qual fui eleita. Refiro-me à Academia Passo-Fundense de Letras, entidade que completa setenta e cinco anos de existência neste mês de abril e já foi palco de grandes feitos, que interferiram fortemente para o desenvolvimento de Passo Fundo e, lógico, da região.
                Esse grupo de acadêmicos não é um grupo social como os outros dos quais fiz parte, na medida em que é um grupo heterogêneo, de pensamento plural, de livres pensadores. Temos interesses diversos, atividades as mais variadas, representantes de muitas linhas filosóficas e religiosas. Somos confrades que, mesmo tão diferentes uns dos outros, trabalhamos para um objetivo comum, que é o de divulgar a cultura, preservar e estimular o correto uso da língua portuguesa, contribuir com nossa produção intelectual para enriquecer o acervo do pensamento universal. Somos um grupo que atua de forma contundente nos ambientes em que estamos inseridos.
                Desde meu ingresso na Academia tenho aprendido com todas as atividades que ajudo a desenvolver. Sinto-me cada vez mais preparada para desenvolver um trabalho de qualidade, estimulada que sou pelo ambiente de muito trabalho e de muita solidariedade.
Desde o início, percebi que estava entrando em algo de uma grandiosidade da qual não suspeitava. Vivi a concretização de projetos que não ficaram no papel, mas foram desenvolvidos um a um e proporcionaram à nossa sociedade momentos ricos em cultura, em arte, em respeito profundo ao pensamento que nos antecedeu, mas reconhecendo e estimulando o pensamento que nasce.
Vi o agigantamento da vontade de acolher a juventude, de conhecer suas ideias, de vê-los reconhecer em si, qualidades insuspeitadas. Os jovens a que me refiro engajaram-se a projetos de literatura, quando leram, escreveram, estudaram, produziram e entraram pela enorme porta da Academia Passo-Fundense de Letras, como autores.
Estou gratificada por fazer parte do sodalício, por ter amigos queridos que me desafiam todos os dias e orgulho-me da contribuição que estamos dando para o refinamento da vida cultural da nossa cidade. Agradeço a minha querida Marilise que, com muita propriedade diz que ser imortal, ser acadêmico, não é um título, mas é uma função. E que função!

Publicado no Diário da Manhã no dia 19/04/2013

terça-feira, 16 de abril de 2013

O que querem as mulheres em cinquenta tons - Café Filosófico

É grande a expectativa acerca do Café Filosófico programado para maio. Estou preparando minha participação na mesa de bate-papo que será composta só de mulheres. A beleza é que seremos mulheres de diferentes idades, profissões, interesses e modos de vida e teremos a tarefa de abordar assuntos pertinentes à condição feminina, seus desejos, suas interdições, sua sexualidade. Logo, logo, posto os detalhes do evento e torçam por uma discussão bem interativa e que todos saiam de lá mais ricos e cheios de possibilidades.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Cinquenta tons de alguma coisa

É um paradoxo o fascínio que a trilogia de E. L. James - Cinquenta Tons de Cinza, Cinquenta Tons Mais Escuros e Cinquenta Tons de Liberdade, exerce sobre as mulheres.  O paradoxo deve-se ao fato de que a mulher, após um mais de meio século de luta contra a opressão, sente-se fascinada por um personagem que escraviza e submete uma mulher, fazendo com que ela, em nome das sensações sexuais que ele proporciona, a deixe ser dominada. 
Interpreto o fenômeno do ponto de vista da vida sexual que nos permitimos levar, ficando sempre aquém do que gostaríamos, isso dito por homens e mulheres.
Fomos educados para a moderação, o comedimento, o respeito ao outro, a vergonha das sensações inconfessáveis, fazendo com que, mesmo desejosos de uma vida sexual apimentada, contentemo-nos com o que é possível, com o que é correto, com o que é aceitável.
Em tempos em que podemos sentir orgasmos múltiplos proporcionados por brinquedinhos fornecidos em sex-shops, em tempos em que o sexo escancarado figura na telinha da televisão de qualquer casa, ainda nos fascina o que uma mulher escreve sobre a sexualidade entre um homem e uma mulher. 
O que transparece nessa histeria coletiva e mundial, é que, mesmo podendo sentir sensações sexuais solitariamente, ou com um cafajeste, ou com o marido, ou com o namorado, procuramos mais sensações, ficando provado que a leitura pode provocar em nós uma catarse que nenhum outro meio consegue. 
Lemos romances há séculos e conseguimos, de alguma forma, nos colocarmos no lugar de algum personagem, ao mesmo tempo em que procuramos uma luz no fim do túnel, por mais sofrido que o personagem seja.
Os romances, no geral, denunciam uma situação social, fornecem uma gama grande de personagens que podem ser veículo de identificação das pessoas, por isso são forma legítima de elaborar os sentimentos da humanidade, que procura sentido, que procura uma saída existencial para as desgraças inerentes à condição humana.
A sexualidade é uma dimensão forte e inerente à condição de sermos humanos e o fato de lermos sobre o que é possível ser sentido nesse quesito, transforma-nos em leitores vorazes. 

Não adianta procurar explicação, não adianta tentar entender. O que se deve fazer é dar um passeio sobre a história da sexualidade e o meu passeio é sobre o que Foucault trouxe na História da Sexualidade, também uma trilogia. 
Na próxima postagem, vamos delinear minha percepção.